Emoções de Belo Horizonte

Hoje o meu date é com a Mochi, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Escolhemos o bar e restaurante Café com Letras para o encontro, porque ambos adoramos livros e um espaço mais calmo onde a conversa possa fluir. Apesar disso, Dona Mochi não é muito falante, e me pego distraído em vários momentos da noite observando as pessoas ao redor e pensando sobre o espetáculo de teatro que assisti antes de virmos para o restaurante. Como ela ficou no hall do CCBB me esperando, nem vale a pena contá-la o que estou sentindo.

Conto para Mochi que a peça também traz o personagem do “macho escroto”. E pela primeira vez eu vejo uma obra humanizando esse personagem, trazendo a realidade construída por trás daquela pessoa que todo mundo conhece. Quando mostrada a sua história, não tem jeito, me identifico e choro novamente. “Eu sou um plano”, ele grita várias vezes. Aquilo ecoou na minha cabeça como se lá dentro de mim existisse um prisioneiro que já vem gritando isso há algum tempo.
É, eu sou um plano!!!

Olho atentamente para Mochi e ela me fala um pouco sobre os lugares por onde já passou. São tantos! Ela não lembra bem, mas parece que antes de nos conhecermos, em Nova Jersey, ela já havia passado por outros países. Depois disso, viajou por vários lugares do Brasil e Europa. Ignoro o fato de que ela não liga para o que vou falar e como bom taurino teimoso, começo a contar um pouco sobre o espetáculo. Ela fica imóvel. Eu continuo falando porque preciso compartilhar o sentimento dentro de mim depois daquilo tudo que eu vi, ouvi, senti. A peça “E ainda assim se levantar” me tirou tantas emoções, que pela primeira vez chorei no teatro. Falaram sobre temas do passado, dos atuais, de coisas minhas, deles, nossas. Em muitos momentos da peça eu quis levantar e gritar, gritar, gritar bem alto. Igual o personagem Cláudio (que linda coincidência) faz. Ele berra, esmurra, pula, corre, chora. E quando lembro de todos aqueles assuntos, tenho vontade de fazer o mesmo; me expressar até o limite, sair da jaula, me sentir limpo, livre. Quando a “sósia de Elis” vem à frente e traz as problemáticas do mundo feminino, eu penso na minha mãe, irmãs, tias, amigas… Como elas passam por tudo isso sem dizer nada, meu Deus? O nó na garganta aperta de novo, e como eles citam no texto: “a gente continua sentado, sem fazer nada”.
É, eu não estou fazendo nada. 

Mochi continua parada, só ouvindo. Ela paralisa igual fazemos quando lemos as notícias nesses últimos tempos. Lembro do Cláudio na peça dizendo várias vezes “eu não sei o que fazer”. Tentamos jogar alguns prazeres no meio do caminho para tentar o mínimo de alívio, mas é só ler outra notícia que, “bum!”, vem tudo de novo. A gente chora, esperneia, xinga muito no Twitter, mas parece que nada muda.
É, eu também não sei o que fazer, Cláudio. 

Me pergunto se Mochi quer saber alguma parte feliz da peça, e comento com ela sobre a cena que mais me impactou. Nunca pensei que choraria com uma música da Gal Costa. Eles conseguiram! Como um grito de liberdade, eu vi aquela cena como se eu mesmo estivesse ali no palco correndo, sorrindo, de braços abertos para a felicidade daquela hora. Foi tão lindo! Eu queria que aquele momento nunca acabasse. Nessa parte eu chorei sim, mas de alegria por estar assistindo algo tão incrível e inspirador. A “sósia de Elis” vai ao microfone e, para nos confortar, diz que esse período ruim vai acabar. No meu coração ainda existe um pouco de pessimismo quanto a isso, mas naquele instante eu me permito ficar longe dos dias de choro, e me encho de esperança. Junto com eles, com a plateia toda. Cantamos. Batemos palma.
É, vai passar.  

Mesmo com toda a minha história linda, Mochi não se pronuncia. Ela me encara e é como se dissesse “vamos para casa, estou cansada”. Tudo bem, Mochi. Podemos ir. Eu só precisava colocar para fora um pouquinho do meu sentimento e você hoje se dispôs, de alguma forma, a ouvir. Agradeço pelo jantar, levantamos e vamos embora. O ar parece até mais leve quando bate no meu rosto. Penso no peso de antes, e repito mentalmente “Vai passar…” 

É… E como dizemos no meu nordeste amado e cheio de “paraíbas”: não tá com a bexiga que não passe!

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